Herdei a metade da biblioteca de Orlando Alves. Ele se foi num 11 de maio, exatamente no dia do meu aniversário, passamos a madrugada juntos na gare derradeira: ele partia, eu ruminava. Orlando Alves foi uma pessoa de incomparável erudição livresca que encontrei nessa Joinville em 1994 quando vim de Londrina para fundar o caderno Anexo. Ao formarmos o time de cronistas foi um dos convidados. Ao lado de José Silveira e Lelito Nóbrega, formavam um triunviratum da palavra, da escrita, da leitura e da conversa, os três à época adentrados nos umbrais septuagenários dessa vida; os três, hoje, já selecionados pelos mistérios da ausência derradeira.
Filho de Joinville, Orlando fora um pioneiro e bem sucedido homem de comunicação no Rio de Janeiro e
Era uma estranha e perfeita simetria de pomerano e luso, conjugando um coração farto e sentimental com rígidos quereres. Um homem simples e complexo. Cultivava as próprias couves e ligava lá no jornal: “ô, Joel, venha com a Wilka comer um caldo verde preparado com as couves do meu quintal”. E punha um sabor, uma alegria, uma incontida felicidade ao depor estas palavras sumarentas. Íamos. Também o Melatti, o Ruiz e o Karl. Frio de maio, vinho de colônia e couves do quintal. E, claro, livros, livros e livros, os mesmos que me olham agora numa orfandade que a minha mão afaga mas não mitiga.
Joel Gehlen
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